Mas quem foi
Aleksandr Soljenístyn? Ele formou-se pela Faculdade de Matemática e Física da
Universidade de Rostov. Mais tarde, faria um curso por correspondência do
Instituto de Filosofia, História e Literatura de Moscou. Em 1941, foi convocado
pelo Exército Vermelho para lutar na Segunda Guerra Mundial. Em 1945, após ter
sua correspondência interceptada pela censura, onde, segundo ela, havia termos
pejorativos referindo-se a Stálin, como, por exemplo, “Chefão”, ele é preso e,
depois de passar por alguns prisões, é condenado a 8 anos nos campos de
trabalho forçado. Entre idas e vindas de mais prisões e campos, em 1953 ele é
liberado e mandado para o exílio. Só em 1957 ele é liberado definitivamente do
exílio. Muita coisa ainda aconteceria com ele até sua morte, em 2008, inclusive
com respeito ao manuscrito deste livro.
A questão aqui é que, como pode-se notar, qualquer pessoa poderia ser presa e condenada sem julgamento por qualquer motivo, desde meras suspeitas de oposição ao regime, passando por algumas frases em cartas, até reais atividades de resistência. E as penas eram absurdas e desproporcionais, variando de 5 até 25 anos de trabalhos forçados, isso sem contar o exílio que poderia vir depois, independentemente de a pena haver sido cumprida.
O livro apresenta as condições horríveis de todo esse sistema prisional e de exílio, com toda a tortura, trabalhos forçados e condições inumanas de sobrevivência e de trabalho, ainda mais se levarmos em conta que a vasta maioria das vítimas não era de criminosos, mas de pessoas comuns que estavam cuidando de suas vidas, e que passaram a ser vigiadas e observadas em todo o país, e calharam de dizer ou fazer algo que poderia ser suspeito.
Além de sua própria experiência, Soljenítsyn contou com dezenas de depoimentos de pessoas que foram tão vítimas quanto ele desse regime.
Arquipélago Gulag é um daqueles livros que não são tão fáceis de ler, e por várias razões: o conteúdo em si, que se trata de um dos períodos mais sombrios e complexos da História; a mistura de estilos usados pelo autor, que passa sem preâmbulos da metáfora à realidade, da linguagem poética a observações históricas e vivências pessoais. Ademais, muitos trechos contêm alusões a pessoas, lugares e acontecimentos próprios do povo russo, que, quando vêm sem maiores explicações, exige um pouco de pesquisa adicional. Porém, o próprio livro contém recursos de apoio: a edição da Carambaia, que é a minha, traz um glossário de termos e pequenas notas biográficas ao final, além de um posfácio do professor Daniel Aarão dos Reis, que ajuda a entender o contexto e funciona como um bom arremate ao fim da leitura. Contamos ainda com uma linha do tempo da vida de Soljenítsyn, entremeada com acontecimentos-chave da URSS/Rússia.
Depois da abertura da União Soviética, muitos testemunhos e livros sobre a Revolução, os acontecimentos posteriores e o “sistema concentracionário” soviético vieram à tona, e Arquipélago Gulag certamente está entre um dos mais importantes.
Arquipélago Gulag
Autor: Aleksandr Soljenítsyn
Editora: Carambaia (2019)
702 páginas